The broken column, Frida Khalo, 1944

sexta-feira, 20 de maio de 2011

Escrevo estrofes de poetisa amargurada

Escrevo estrofes de poetisa amargurada
Canto como é vazia a madrugada
E danço como bailarina louca!

Conto uma história que é mentira,
Afirmo como me magoa essa verdade
E espalho esse amor pela cidade!

Grito como o amor me amordaça,
Defendo com a vida esta praça
E aí vivo meu degredo!

Conto o meu segredo a quem passa
E a alma penada que me ouvir,
Vai-se com as minhas penas a rir!

(Vila Verde, 12/03/2011)

(Lying by the rags, Lucien Freud, 1990, www.the-athenaeum.org)

quinta-feira, 19 de maio de 2011

Meu desejo

Que tenhas dias bons é o que te desejo –
 Eu fico com os outros, sem qualquer pejo!
Que sejas feliz é o teu destino –
 Eu infeliz, e sem conhecer mimo!
Que vejas as cores que sei que beijas –
 Eu fico com o negro que rejeitas!
Que tenhas mais filhos, se quiseres! –
 Eu se tiver mais, serão os das outras mulheres!
Que te apaixones mais vezes –
 Eu já não tenho dessas sedes!
Que escrevas todas as cartas –
 Que eu (louca!) não quis dar-tas!
Que vivas canções de amor –
 Eu escrevi-as, mas já não as sei de cor!
Que toques todas as músicas num único harpejo!
Que tenhas mais dias bons é o que te desejo!

(Vila Verde, 8/3/2011)

(Almost time, Samy Charmine, 1994, www.charmine.com)

domingo, 15 de maio de 2011

Comecem a bater palmas

Comecem a bater palmas!
Já chorei todas as lágrimas!
Vou-me, agora mesmo, embora.
Sim, é chegada a hora!
Já não sei da calma,
Perdi algures minha alma!
Dei ao rico o dinheiro,
O livro, a casa, até o seio.
Já não sei de mim!
Morreu meu jardim.
Não tenho qualquer sexo.
Hoje o ser é desconexo!
A pé vou eu agora,
Pois já nem sou senhora.
Não ouço mais a razão.
Matei meu coração!
Comecem a cantar!
Já não há que lamentar!
Vou-me, agora mesmo, embora
Porque é chegada a hora!

(Vila Verde, 7/3/2011)

(La femme penchée, Max Ernst, 1923, http://www.ecriture-art.com/)

sexta-feira, 13 de maio de 2011

Gigante descrente

Quero aquele corpo estranho esquecer,
O que demos e o que não demos.
A noite, de tão triste foi gelada,
Quando esperávamos fosse a mais quente.

Quero a dor daquele momento perder,
A paixão pálida que então vivemos,
As mãos que não foram fadas
E o sexo que não foi ardente.

Quero deixar aquele amor perecer
Porque não explico a alma que não pusemos
Nas parcas carícias partilhadas,
Nem o corpo que não solucionou a mente.

Queria, todavia, algum futuro entrever
Porque o pesadelo do pouco que fizemos
Poderia ser a quimera para outras caminhadas,
Mas aquele passo de tamanho gigante revelou-te descrente!

(Braga, 11/05/2011)
(Adam and Eve, Jan Van Eyck, 1432, http://www.fineart-china.com/)

quarta-feira, 11 de maio de 2011

Quem?


Menino, quem te emagreceu?
Que neves infindas há em teus cabelos?
Quem te ensinou todas as dores
E te arrancou a força do touro?

Menino, quem te envelheceu?
Que negrumes suicidas há em teus olhos?
Quem te contou histórias de ogres
E não te deixa encontrar o pote do ouro?

Menino, quem te abandonou?
Que labirintos a sós percorreste?
Que mundo tanto tempo te sufocou
E não te deixou deslumbrar perante o Douro?

Menino, quem te sufocou?
Que ossos descarnados há em tua alma?
Quem te ofereceu a caixa de Pandora
E te roubou o infinito tesouro?

Menino, quem te matou?
Quem te assassinou sabendo de tuas relíquias?
Quem desejou a ponte levadiça sempre aberta? Menino,
Não fui eu quem provocou esse sofrimento imorredouro!

(Braga, 11/05/2011)

     
(Criança geopolítica assistindo ao nascimento do Novo Homem, Salvador Dalí, 1943, http://opergaminho.wordpress.com

sábado, 7 de maio de 2011

Meu coração é externo

Ganho terras mas perco mundos
Em todos os segundos!
Em tanta má hora,
Apenas um leve bom agora!
Em todos os dias
Conheci magnas desditas!
Em tantas madrugadas
Dormi horas quentes e geladas!
Canto todo o infinito
Tal como apregoo os gritos!
Anseio por fragmentos de amor
E tenho magnânima dor!
Em momentos eternos
Meu coração é externo!
Não vivo em mim,
Passo apenas por aqui!
Em horas de viver,
Sei tão bem morrer!

(Vila Verde, 7/3/2011)

(The paralyzing fear of love, Michael Maier, 2009, http://lovsnmua.wordpress.com/)

quinta-feira, 5 de maio de 2011

Vivo como louca

Gosto de ti e dele e do outro!
Amo quem gosto: o de cobre e o de estanho.
Amo menos estes que são de prata e de ouro.
Nenhum filho resulta deste empenho!
Eu sou apenas uma louca!

Partilho todas as intimidades!
Dou todos os meus líquidos!
Visito-vos em todas as cidades!
Vivo por todos os sítios!
Eu mais não sou do que louca!

Tenho em mim muitos prismas
E pérolas que dou a porcos!
Sofro de todas as cismas!
Serão meus ares assim tão loucos?
Eu sou realmente louca!

Duas ou mais em mim tenho –
Aquela que gosta e a que ama também!
Não frutifica tamanho engenho
Pois estou num momento aqui e além!
Dentro de mim vivo como louca!

(Vila Verde, 8 e 11/03/2011)

(The menaced assassin, René Magritte, 1927, http://moma.org)